Tô na Vida com uma nova Ana Cañas

sábado, 21 de novembro de 2015
Sempre tem aquele cantor ou cantora que não damos muita atenção, que passa despercebido pelos nossos fones de ouvido ou ignoramos quando vem a nossa cidade fazer um show. Era meu caso quando se tratava de Ana Cañas. Não considerava ela uma cantora ruim, pelo contrário, a voz é linda. Mas havia algo em seu som que não me cativava. No meio de tanta cantora, achava mais do mesmo. Com Tô na Vida, quarto álbum de estúdio, lançado esse ano, paguei a língua. 


Em Tô na Vida, Ana Cañas traça e percorre um caminho bem diferente de seus trabalhos anteriores. A voz continua a mesma, afinada e bem colocada. Mas, dessa vez, ganha identidade. Com produção de Lúcio Maia (Nação Zumbi) e da própria Ana Cañas, o disco traz uma pegada rock e é essencialmente autoral.  
Mesmo tendo flertado com o rock em seu segundo disco, “Hein” (Sony Music, 2009), que traz a bela canção “esconderijo”, só agora em Tô na Vida, as canções assumem definitivamente um atmosfera roqueira, emolduradas por guitarras. A faixa que abre o disco, “Existe”, já dá uma mostra dessa transformação, que resulta em algo surpreendente e agradável.
As composições falam de amor, sem ser brega, e ainda tem espaço para canções de cunho feminista como “Mulher”. Os versos dizem: “Sou preta, sou branca, sagrada, profana, sou puta, sou santa, mulher”, que nos remete a rainha do rock brasileiro Rita Lee, tanto na performance vocal quanto na letra semelhante a “Pagu”.
A parceria com Arnaldo Antunes redeu três boas canções, destaque para o single que dá nome ao disco “Tô na vida”, cuja guitarra de Lúcio Maia é responsável por conferir um ar de rock retrô, e a ingênua, porém poética “Um dois um só”, que parece refletir um amor adolescente: "Quando te vi te amei, quando te quis te desejei. E agora que a gente deu um nó, você em mim, nós dois um só", diz os versos da canção. 
A mais inspirada do disco é “Hoje nunca mais”, assinada com Dadi, que não pesa na guitarra para deixar disseminar toda afetuosidade que sugere a canção, sem dúvida a mais bonita do repertório. Mas, o rock volta aparecer com força total em “O som do osso” (Ana Cañas, Lúcio Maia, Pedro Luís), “feita de fim” (Ana Cañas) e “Indivisível” (Ana Cañas), essa última com riffs que remetem a rocks clássicos, no melhor estilo "I Love rock’n’roll". A lista de parceiros inclui ainda a presença ilustre de Marcelo Jeneci, nos teclados, e a banda base formada por Fábio Sá e Betão Aguiar (baixo) e Marco da Costa (bateria).
Nada como o tempo para amadurecer o artista e o ouvinte. Em seu quarto álbum de carreira, Ana Cañas nasceu para mim. Finalmente seu som me cativou. Sem dúvida, Tô na Vida está entre os melhores discos do ano.




De volta!

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Atendendo a pedidos, depois de quase três anos sem atualizações, o blog Todos os Ouvidos está de volta. Vamos falar sobre música sem a pretensão de soar como crítica especializa. O interesse aqui é abrir para o debate, expor opiniões.

Lembrando que o blog não fica restrito a agenda de lançamentos de discos, como costumam fazer os cadernos culturais dos jornais, revistas e até outros blogs. Discos novos, discos velhos, registros musicais, clipes, tudo que valer uma resenha e render opiniões será publicado.


Os melhores discos nacionais de 2012

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013
Mais um ano começou, o carnaval acabou e o Todos os Ouvidos demorou pra fazer sua listinha de melhores de 2012. Mas estamos de volta e nada melhor que na primeira postagem de 2013 façamos um flashback dos melhores lançamentos musicais do ano que passou. Foram muitos trabalhos bacanas que fizeram a alegria de quem gosta de boa música. Listas dos "melhores" são sempre polêmicas, às vezes injustas e carrega sempre um gostinho pessoal. Por esse motivo a nossa classificação serve mais como sugestão aos leitores. Muitos dos álbuns abaixo receberam boas críticas e se destacaram no cenário musical, vocês facilmente irão encontrá-los em outras listas por aí.

Agora vamos aos destaques de 2012:




10 – Segunda Pele (Roberta Sá) O ano de 2012 começou bem. Roberta Sá lançou Segunda Pele, um disco muito agradável, que segue uma linha diferente dos trabalhos anteriores. O samba ficou de lado e deu lugar ao pop. Roberta saiu da sua zona de conforto e mostrou um repertório mais eclético, uma sonoridade mais diversa e livre. A música de abertura “Lua” já anuncia a novidade. Renovação é a marca desse trabalho, por isso ele é presença garantida em nossa lista. Destaque: Bem a Sós, Pavilhão de Espelhos.

9 – The Moon 1111 (Otto) Depois do aclamado “Certa manhã acordei de sonhos intranquilos” (2009), Otto lançou em novembro passado o disco The Moon 1111, com uma sonoridade pop, kitsch, tecnopop e rock. A atmosfera depressiva do trabalho anterior fica menos evidente nesse novo disco. Momentos dramáticos presentes algumas composições se equilibram com o humor em outras. O repertório é bem costurado. Destaque para as músicas: Ela Falava, Dia Claro, Exu Parade.





8 – Arrocha (Curumim) O som orgânico registrado nos trabalhos anteriores sede lugar as batidas eletrônicas. O disco revela um caráter intimista por ser todo gravado de maneira digital e em estúdio caseiro. O rústico e o moderno se misturam. Destaque: Selvage, Passarinho, Tupazinho Guerreiro.










7 - Treme (Gaby Amarantos) Sem dúvida o som do estado do Pará despontou no país, não só com o aparecimento de cantores talentosos como Lia Sophia e Felipe Cordeiro, mas porque o tecnobrega ganhou ares cult. O Brasil passou a conhecer o ritmo que vêm de uma Amazônia aparelhada, moderna e vibrante. Treme de Gaby Amarantos entra na nossa galeria de melhores, trazendo um Brasil sonoro que poucos conheciam. Destaque: Pimenta com Sal, Ela tá Beba Doida, Ex My Love, Ela tá no ar.




6 – Claridão (Silva) Erudito, moderno, eletrônico e pop. Esse conjunto é que caracteriza o trabalho de Silva. Melhor descoberta sonora de 2013. Destaque: Cansei.








5 – Tropicália Lixo Lógico (Tom Zé) Eclético e inventivo como sempre, Tom Zé revisita o movimento Tropicalista nesse novo disco. Esse trabalho pode causar certo estranhamento, mas sem dúvidas é um verdadeiro estudo das origens do Tropicalismo em forma de música. Tem ainda participações super especiais, entre elas a de Mallu Magalhães, Emicida e Rodrigo Amarante. Destaques: Capitais e Tais, Tropicalea Jacta Est, O Motobói e Maria Clara.




4 - Tudo Tanto (Tulipa Ruiz) Tulipa passou na prova do segundo CD e trouxe um trabalho tão bom quanto o primeiro. A temática urbana e as crônicas do cotidiano continuam sendo comuns nas suas composições. Destaque: É, Dois Cafés, Víbora.










3 – O Deus Que Devasta Também Cura (Lucas Santtana) Nesse disco Lucas aposta na brasilidade e ritmos diversos. Tem até homenagem a Belém do Pará em “Ela é Belém”, trazendo uma pegada tecnobrega, e a São Paulo em “Se Pá Ska S.P”, carregado de um ritmo frenético que simboliza o aspecto caótico da cidade. Enfim, um disco para se ouvir do começo ao fim em alto e bom som. Destaque: Vamos Andar Pela Cidade, Dia de Furar Onda no Mar, O Paladino e Seu Cavalo Altar.



2 – Caravana Sereia Bloom (Céu) A vida na estrada serviu de inspiração para o novo disco de Céu. A sonoridade jazzística e meio hippie dos discos anteriores dão lugar ao bolero e ao brega. Destaque para: Falta de Ar, Retrovisor, Chegar em Mim.









1 – Abraçaço (Caetano Veloso) O disco encerra a trilogia iniciada com "Cê" (2006) e "Zii e Zie" (2009), o projeto roqueiro que levou o cantor a se tornar mais popular entre o público jovem. Aos 70 anos Caetano mantém o vigor criativo. Em Abraçaço encontramos uma bossa nova agressiva em “A Bossa Nova é Foda” e o funk bem sucedido de “Funk Melódico”. Abraçaço é um discaço!






Que venham bons discos em 2013!

A Bossa Nova de Fernanda Takai e Andy Summers

sexta-feira, 9 de novembro de 2012
O lançamento de Fundamental, novo disco solo da cantora Fernanda Takai (Pato Fu) em parceria com Andy Summers (Ex The Police), foi cercado de muita expectativa. O convite para fazer parte do projeto partiu do próprio Summers que, segundo ele, havia composto todas as músicas pensando na voz doce e objetiva de Takai. É claro que o convite foi prontamente aceito. Foram enviadas 18 músicas, nas quais 11 foram escolhidas pela cantora para fazer parte do álbum. Algumas ganharam versões em português feitas por John Ulhoa, Zélia Duncan e da própria Takai, sozinhos ou em parceria. O CD traz uma Bossa Nova com pegada pop e foi lançado também na Europa e Japão. No entanto, “Fundamental” é pouco sedutor.

Para quem acompanhou a estreia da cantora do Pato Fu na carreira solo com o elogiadíssimo “Onde Brilhem os Olhos Seus” (2007), ou mesmo sua trajetória na banda, poderá sentir certa estranheza nesse segundo trabalho. Pois mesmo tendo apresentado uma releitura de sucessos consagrados na voz de Nara Leão, aquele disco conseguia trazer um frescor e dar um ar de novidade as canções. Versões criativas e ousadas, mas sem perder a ternura. Agora, longe dos arrojos artísticos de seu marido John, “Fundamental” ganha uma identidade sóbria demais, algumas vezes burocrática e cansativa. A voz de Fernanda está ótima como sempre, segue a sofisticação dos arranjos de Summers, mas há poucos momentos de ousadia, diria até de liberdade.

Mas o problema está exatamente em estar acostumado com Fernanda no Pato Fu ou sob a supervisão de John. Ao esquecer isso, o disco soa gostosinho até pra quem não está habituado a Bossa Nova. A faixa que dá título ao CD é altamente agradável de ouvir. Algumas canções rompem momentos de marasmo como “No mesmo lugar (Here i am again)”, “You Ligth my dark”, “Smile and blue sky me” e a excelente “Human kind”. No mais, “Fundamental” é um disco que prima pelo sofisticado arranjo instrumental, que traz o percussionista Marcos Suzano transmitindo mais brasilidade as canções, e baixista mexicano Abraham Laboriel.

Apesar do estranhamento inicial, eu que sou fã da Fernanda, me acostumei com a sonoridade do disco. Hoje, ele é fundamental na minha lista de álbuns favoritos.



O fervor criativo da Tropicália

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Em uma antiga postagem, que está entre as mais vistas do blog, eu falava da importância da Tropicália, um movimento cultural que transformou a MPB e causou muito barulho no final da década de 60. Hoje, todos reconhecem a importância da Tropicália na música e cultura nacional, mas, na época, as vaias e a rejeição eram quase unânimes. O Brasil vivia assim dois tipos de ditadura, a militar e a da MPB conservadora, que defendia a música brasileira sem qualquer intervenção ou influência estrangeira. O movimento criado por Caetano Veloso e Gilberto Gil é o produto do documentário – Tropicália, que está em cartaz em todo Brasil.

O movimento durou menos de dois anos, mas foi o suficiente para se consagrar como a última vanguarda musical. O documentário traz imagens raras e tem uma produção muito caprichada. O filme, num primeiro momento, volta no tempo para traçar o perfil dos seus personagens principais, mas focando o período entre 1967 e 1969, no qual o movimento aconteceu de fato. Depois avança até o início dos anos 1970 para mostrar o período de exílio de Caetano e Gil na Inglaterra.

O filme retrata vários momentos marcantes, entre eles a apresentação de Caetano e Gil no III Festival da Música Popular Brasileira, da TV Record, em 1967, que foi o marco inicial do movimento. Mostra ainda, o arrepiante episódio em que Caetano é vaiado ao cantar “É Proibido Proibir”, no III Festival Internacional da Canção, 1968, e o seu discurso inflamado: “Se vocês forem em política como são em estética, estamos feitos”. Enfim, o documentário traz registros pouco conhecidos, inclusive para os tropicalistas, como, por exemplo, a apresentação de Caetano, Gil e mais alguns amigos no Festival da Ilha de Wight, em 1970. Há depoimentos e presença de outros personagens, entre eles, Tom Zé, Nara Leão, Gal Costa, Torquato Neto, a turma dos Mutantes. Várias cenas arrepiam a gente pela efervescência criativa que foi o movimento.

Vale muito a pena ir ao cinema para assistir ao documentário Tropicália e conferir um dos momentos mais criativos e inteligentes da música brasileira.


Um tudo e um tanto de bom

quinta-feira, 23 de agosto de 2012
Depois do grande sucesso de Efêmera (2010), que figurou entre os melhores discos daquele ano em várias listas especializadas, Tulipa Ruiz retorna ainda mais ousada e com um som ainda mais contagiante que no trabalho anterior. Tudo Tanto foi lançado recentemente, inclusive pode ser baixado gratuitamente no site da cantora. O repertório traz 11 faixas e incluem algumas participações especiais. O cantor Lulu Santos toca guitarra e divide os vocais com Tulipa em "Dois Cafés", música que fala sobre as aflições cotidianas dos novos tempos. Um pop leve e radiofônico. Vale mencionar também a partição do rapper Criolo na faixa “Víbora”, uma das melhores do disco, na qual a cantora explora sua voz de forma intensa, crua, visceral, destilando toda acidez que a letra propõe. “Metade homem, metade omisso/ Uma parte morta, outra parte lixo”.

Tudo Tanto mostra uma Tulipa renovada, bem mais a vontade e desafiadora. Ela não se acomodou com o sucesso do primeiro disco. Nesse novo trabalho os temas são mais genéricos, universais, ao contrário do disco anterior onde o assunto principal eram histórias do cotidiano, situações mais específicas, leia-se as músicas “Pontual”, “As vezes”, “Da menina”, “Sushi”. A canção “Desinibida”, de Tudo Tanto, conta a história de uma menina solteira, extrovertida, bem resolvida e livre, lembrando um pouco a história de “Pedrinho” do álbum Efêmera, um rapaz também confiante, daqueles que fala o que pensa e sempre te surpreende.

Antes do lançamento oficial, foram divulgadas as músicas “É”, confirmando a pegada pop e potencial radiofônico da canção, além de “Dois Cafés” e “Ok”, essa última a mais ensolarada do disco. Apesar das três faixas serem facilmente comerciáveis, o que poderia gerar um certo receio e preconceito de nossa parte, o disco, de maneira geral, é bem organizado, cumpre e supera as expectativas em torno de um segundo disco. Confirmo aqui o que já tinha dito na primeira postagem sobre Tulipa, seu som é mesmo viciante.

Veja o clipe de "É". Lindo! Vale a pena conferir.

Alegria, alegria! Caetano Veloso faz 70 anos

quarta-feira, 8 de agosto de 2012
Terça-feira (07), um dos músicos mais importantes da história da música brasileira - Caetano Veloso - completou 70 anos. Mesmo não querendo fazer da data um evento, o dia foi marcado por várias homenagens, por parte dos fãs, nas redes sociais e, além disso, o cantor ganhou um disco tributo. O álbum intitulado "A Tribute to Caetano Veloso", que já começou a ser distribuído pela gravadora Universal, é uma verdadeira homenagem ao artista. Músicos nacionais e internacionais se revezam na interpretação das suas canções mais importantes. Entre os convidados estão o uruguaio Jorge Drexler "Fora da Ordem", o espanhol Miguel Poveda "Força Estranha", a cantora portuguesa Ana Moura "Janelas Abertas nº 2", o americano Beck "Michelangelo Antonioni", a banda londrina The Magic Numbers "You don"t know Me" e Chrissie Hynde "The Empty Boat". Marcelo Camelo, interpreta "É de Manhã", Seu Jorge, com "Peter Gast", Os Mutantes, com "London, London", e Mariana Aydar, com "Araçá Azul".

Nascido no dia 7 de agosto de 1942 em Santo Amaro da Purificação, no interior da Bahia, Caetano Veloso foi um dos idealizadores do Tropicalismo que provocou mudanças profundas na estrutura da música brasileira. E como todo movimento de vanguarda recebeu críticas, não sendo bem recebido pelos conservadores de plantão. Estrelou também o show dos Doces Bárbaros em parceria com Gilberto Gil, Maria Betânia e Gal Costa, o disco homônimo de 1976 é considerado um dos melhores trabalhos da música nacional de todos os tempos. Durante a ditadura ele foi acusado de subversão, foi obrigado a se exilar em Londres, mas não deixou de compor. Ainda no exílio lançou “Transa” (1972), um dos seus discos mais cultuados. Recentemente, ele assinou todas as faixas do novo disco de Gal Costa, “Recanto”, além de produzir o show. E promete, ainda para esse ano, um novo disco de inéditas com a banda Cê. O aniversariente é Caetano, mas quem recebe o presente somos nós, os fãs.

Ouça Eclipse Oculto na voz de Céu :