Irreverência e genialidade com sotaque francês

terça-feira, 27 de julho de 2010
Prepare-se para uma nova experiência musical, se você é daqueles que curte sons inusitados e performances nada convencionais, vai gostar de Camille Dalmais, uma cantora francesa que descobri há algum tempo e já andei comentando por aqui. O que mais chama atenção, é que ela transforma seu próprio corpo e voz em instrumento de percussão, uma sonoridade estranha para o universo pop e certamente será para vocês. Mas é super bacana, já me acostumei e até virei fã de seu estilo.

Camille era integrante da banda francesa Nouvelle Vague, um grupo que tocava clássicos do punk rock e new wave em tom de bossa nova. Em 2002 lançou seu disco de estreia em carreira solo, “Le Sac de Filles”, nesse primeiro álbum, ela já dava os primeiros sinais de sua personalidade. Mas, somente no seu segundo trabalho "Le fil", de 2005, é que a cantora firmou seu estilo. O álbum foi consagrado pela crítica e bem recebido pelo público, conseguindo atingir a marca de 500 mil cópias vendidas. Nesse trabalho considerado genial, o disco tinha as quinze faixas conectadas por uma única nota, por isso o Le fil (o fio) e as músicas eram exploradas na base de uma voz, um baixista e, por vezes, um teclado. O cartão de visitas de “Le fil” é a canção “ Ta douleur”. Em 2008, Camille lançou seu terceiro álbum “Music hole”, gravado primordialmente em inglês, com a intenção clara de atingir outros públicos. Não sendo tão conceitual quanto o anterior, “Music hole” alcança grandes momentos, principalmente nas faixas “Gospel with no lord”, “Money note”, na qual faz graça com quem conquistou fama com seus agudos fortíssimos (Celine Dion, Whitney Houston, etc), "The monk" e "Katie's tea".

Enfim, Camille foi uma experiência estranha no começo, achei ela meio “maluca”, depois passado a estranheza, achei genial. Seu trabalho surpreende pela originalidade com que mescla ritmos, vocais, bases eletrônicas e suaves melodias francesas. J'adore Camille!

Clique nos links abaixo e veja o clipe das músicas:

Ta douleur

Money Note

Meu ouvido não é penico!

terça-feira, 20 de julho de 2010

Todo mundo tem o direito de ouvir a música que quiser, seja ela boa ou ruim, porque gosto é igual a ouvido cada um tem o seu, desde que cada um curta seu som no seu espaço, sem ninguém precisar ser torturado. Digo isso porque não há nada pior que estar dentro de um ônibus quando algum passageiro “esperto” decide pegar o celular e colocar aquela música baixo astral em volume máximo, e o cara em questão ainda se acha o máximo por socializar o mau gosto. Ou quando você está tomando sua cerveja gelada num boteco, conversando com amigos e chega alguém em um carro, abre o porta malas, mostra toda potência do seu aparelho de som e coloca no replay aquela música de gosto duvidoso, isso quando não sai de dentro do automóvel moças e rapazes afim de exibir seus dotes coreográficos descendo até o chão.

Não sou preconceituoso quanto a gêneros musicais, apesar de minhas preferências ouço de tudo um pouco. Mas sou completamente intolerante quando se passa dos limites, quando a música é vulgar até o último acorde. Alguns gêneros estão infestados disso, em especial, o funk, forró e o pagode baiano. Vou citar apenas alguns casos do pagode baiano, já que sou da Bahia e estou mais exposto as pérolas desse ritmo. Algumas letras se referem à mulher de forma pejorativa e humilhante, algo assim... suuuuper natural. Em uma das canções do grupo Black Stile, por exemplo, chamada "Patinha", é narrada as peripécias de uma garota de nome Marcela, prima de Isabela, que pegou todos os rapazes da banda, culminando no refrão nada delicado "me dá, me dá a patinha, sua cachorrinha...”, é pavoroso, é revoltante, dá vontade de mandar um recado para o “compositor” dizendo: “você não tem mãe não é, p***?”. Essa é apenas uma das diversas canções do grupo, sendo todas do mesmo naipe, não vou nem elencar aqui por questão de constrangimento. Vale destacar que essa (des)qualidade não é exclusiva ao grupo musical em questão.

Vocês podem até argumentar que se eu estou falando sobre isso é porque eu escuto esse tipo de música, não, eu não consumo esse tipo de música, não vou ao Salvador Fest, nem ao Pagodão Elétrico,mas estou a mercê dos alto falantes dos carros, dos celulares de gaiatos, dos vizinhos sem noção. Então, caros leitores, o Rebolation pode ser ruim, pobre, mas é inofensivo perto disso aí. Além de não comprometer ninguém, apenas atormentar nossos ouvidos.

O Tropicalismo " É proibido proibir"

segunda-feira, 12 de julho de 2010
Alguns posts atrás falei da importância da canção Like a Rolling Stone para a evolução da música e transformação da cultura pop mundial, assim como a revolta dos ouvintes mais tradicionais. Pois bem, hoje falo do Tropicalismo, um movimento de ruptura que transformou o cenário musical e cultural brasileiro no final da década de 60. Como todo movimento que ousa transformar, o caminho foi turbulento, mas fundamental para a evolução da música nacional.

A Tropicália formava um grande coletivo, seus principais representantes eram Caetano Veloso, Gilberto Gil, Torquato Neto e Rogério Duprat, que contavam ainda com a participação dos Mutantes, Gal Costa, Nara Leão e Tom Zé. Os tropicalistas rompiam com os preconceitos musicais, as influências estrangeiras eram consumidas para serem recriadas, reelaboradas de acordo com nossas necessidades e interesses, num processo verdadeiramente criador. Na tentativa de universalizar a MPB o grupo buscava incorporar elementos da cultura jovem mundial, como o rock, a psicodelia e a guitarra elétrica, com procedimentos eruditos, elementos da cultura popular brasileira, misturando rock com samba, com bolero, com bossa nova, com baião. Com essa atitude, eram rompidas barreiras, pop x folclore, alta cultura x cultura de massas, tradição x vanguarda, estabelecendo um novo padrão sonoro e literário para a música brasileira, impulsionando a modernização não só da música, mas da própria cultura nacional.

A definição da “qualidade musical” no País, pós Bossa Nova, estava cada vez mais dominada pelas posições tradicionais ou nacionalistas de movimentos ligados à esquerda. Então, como toda inovação, o tropicalismo despertou reações de aplausos, mas principalmente indignação. A esquerda radical repudiava o uso da guitarra elétrica, “o instrumento musical do imperialismo”. A apresentação de Gil e Caetano no III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, em 1967, causou impacto no público, em especial nas alas de esquerda mais radical, exatamente pelo uso das guitarras elétricas e pela presença de um grupo de rock – Os Mutantes, era uma espécie de afronta a brasilidade. Um ano depois, no Festival Internacional da Canção, promovido pela Rede Globo, Caetano, acompanhado pelos Mutantes, defendeu a música É Proibido Proibir e a platéia respondia ferozmente com vaias. Os Mutantes mal tinham começado a tocar a introdução da música e a platéia já atirava objetos e davam as costas ao palco, a reação dos Mutantes foi imediata, sem parar de tocar, viraram as costas para o público, e Caetano fez um longo e inflamado discurso questionando os ideais dos jovens ditos “revolucionários” ali presentes. Eles foram incapazes de reconhecer na música seu caráter de protesto. Grande ironia, jovens tão engajados politicamente, mas intolerantes em relação à música, como lá em “Like a Rolling Stone”, do Bob Dylan.

A irreverência e ousadia do movimento tropicalista transformaram os critérios de gosto vigentes, não só na música e na política nacional, mas também na moral e no comportamento. O movimento, libertário por excelência, durou pouco mais de um ano, pois foi reprimido pela ditadura, mas deixou para sempre sua marca na música e na cultura nacional, a marca da modernidade.

O discurso de Caetano é de arrepiar. Para quem tiver interesse ouça uma parte do desabafo junto as vaias.